top of page
PUBLICAÇÕES: Blog2
Buscar
Foto do escritoruniversitariospsic

Orientação Não-Diretiva

Franz Victor Rudio em seu livro “Orientação Não-Diretiva: na educação, no aconselhamento e na psicoterapia” nos traz importantes conceitos para a nossa atuação profissional baseado nas obras de Carl Rogers.

Franz Victor Rudio apresenta como relação de ajuda uma conversa estruturada, com papéis específicos, onde uma pessoa busca ajuda e a outra é capaz de fornecer o auxílio necessário, de onde resulta uma interação. Ele cita Rogers, que faz uma diferenciação entre aconselhamento e psicoterapia, sendo a primeira referente a entrevistas mais superficiais e a segunda a um contato de duração mais prolongado e profundo, visando à reorganização da personalidade do indivíduo. Nessa relação de ajuda a atenção não deve se focalizar sobre o problema da pessoa, mas sobre a própria pessoa, sobre o seu potencial de crescimento, maturidade, desenvolvimento, autonomia e auto realização.

Para que esse processo ocorra é necessário a “aceitação de si” por parte do indivíduo, através do qual ele entra em comunicação consigo mesmo, pois só através de uma boa comunicação interior ele é capaz de se comunicar bem com os outros. E a psicoterapia serve para reconstruir esse processo comunicativo.

A terapia não é um monólogo onde o terapeuta permanece indiferente, conivente ou apenas observador, mas sim um diálogo, onde o terapeuta é participante, vivendo a experiência psicoterápica e caminhando junto com o cliente. O terapeuta deve utilizar-se de atividades informantes, para esclarecimento, para que o próprio indivíduo utilize de atividades estruturantes, segundo a qual ele determina quais acontecimentos e valores são significativos para ele, e quais objetivos precisam ser alcançados. Nesse sentido, o terapeuta não lhe dá respostas, mas o auxilia a fazer suas próprias descobertas. Por isso a terapia é não-diretiva, mas não sem direção, pois nela está presente a significação orientada.

Segundo ao autor, uma pessoa congruente é aquela que representa adequadamente suas experiências na consciência, assim como a imagem de si, tendo como resultado desse processo a autenticidade. A representação correta se dá de acordo com a harmonia entre a experiência real e sua construção mental, entre sua representação na consciência e sua expressão; onde uma experiência pode ser impedida de ser simbolizada ou a ser distorcidamente, a fim de proteger a imagem que a pessoa tem de si mesma (self), o que gera a incongruência, onde suas necessidades, sentimentos e visão da realidade chegam deformados à consciência, ou são impedidos de serem simbolizados, ou mesmo não expressos de forma autêntica. Assim, na psicoterapia não-diretiva, o indivíduo tem a oportunidade de comprovar os conteúdos representados em sua consciência, e distinguir as simbolizações incorretas transformando-as em corretas, bem como ter acesso aos conteúdos recalcados que não foram disponíveis a elaboração na consciência.

Essa incongruência se dá pelo fato de a pessoa ter, no passado, vivenciado situações que a impediram de representar corretamente suas experiências na consciência, ou mesmo expressá-las. Isso leva a um desajustamento psicológico, onde o indivíduo coloca o seu centro de avaliação no outro, na pessoa-significativa ou critério, e não em si mesmo. Para que o individuo possa explorar sua personalidade e reconhecer suas incoerências, é necessário que o terapeuta lhe forneça uma situação favorável onde a pessoa sinta tranquilidade e confiança, através de um clima permissivo com liberdade experiencial, podendo manifestar tudo o que pensa e sente, sem o medo de ser julgado, punido ou interpretado. A autenticidade é a busca de coerência do indivíduo consigo mesmo, que só será possível se este quiser e puder ser ele mesmo, “sem a necessidade de esconder-se atrás de máscaras ou fachadas” (p. 14).

Segundo Rudio, uma pessoa rígida: “tende a utilizar rótulos, fórmulas ou normas para conduzir sua vida. Tem horror de ser ‘incoerente’. E, no entanto, a experiência nos ensina que todo ser humano é contraditório. Uma fórmula pode estabelecer que ‘o corajoso não tem medo’. Entretanto, a experiência nos diz que todo valente tem momentos de covardia” (p. 45).

É necessário que o terapeuta compreenda o cliente não através de sua própria percepção, mas através da percepção do cliente, através dos significados que o cliente dá ao seu próprio mundo. É necessário, segundo Rogers, que o terapeuta entre em contato com o quadro de referências do indivíduo, contexto através do qual ele expressa seus significados próprios.

A preocupação não deve estar focalizada diretamente sobre a mudança de comportamento, mas sobre a mudança de percepção, pois quando esta muda, o comportamento se transforma em consequência.

Segundo Rogers o “insight” é o resultado de uma elaboração interior, onde a pessoa faz uma descoberta, apreende um novo sentido, uma nova compreensão. Momento este, que não pode ser forçado nem apressado, devendo-se respeitar o ritmo de cada pessoa.

O indivíduo, nesse sentido, não pode mudar quem é se, antes, não se aceitar.

É necessário que o terapeuta incentive no cliente a capacidade de “ouvir a si mesmo”, na busca de ser-realmente-o-que-se-é-em-profundidade. Ser autêntico não significa dizer tudo o que pensa, mas pensar em tudo o que se diz. É ter suas energias investidas em seu próprio crescimento e não em soluções defensivas, é “fazer as qualidades e os defeitos se contrabalancearem mutuamente na busca do ser e do agir” (p. 54), levando-se a virtude e não ao vício. É saber separar sua própria individualidade da dos outros, sem precisar agradá-los ou provar-lhes algo, sem precisar se esconder, mas sendo transparente, aceitando-se, para fazer as mudanças necessárias, e ter um relacionamento mais construtivo consigo e com os outros.

A orientação não diretiva considera que as camadas mais profundas do ser humano são naturalmente construtivas, possuindo uma visão otimista, onde o ser é capaz de dirigir a si mesmo, onde todo ser humano possui uma tendência ao desenvolvimento; visão esta necessária na psicoterapia.

Significa acreditar na capacidade do indivíduo de compreender e resolver seus problemas, de realizar-se, de ser capaz de curar a si mesmo. A função do terapeuta é a de criar condições favoráveis para que isto ocorra.

Rudio escreve que respeitar a pessoa humana é não determinar nada a esta, mas ajudá-la a autodeterminar-se, a “andar por si mesma”. É necessário que o terapeuta tenha por ela uma consideração positiva incondicional, através do acolhimento, respeito, aceitação; satisfazendo assim a necessidade que todo ser humano tem de ser amado; necessidade esta que não pode ser negada sem prejudicá-lo em seu desenvolvimento e realização.

O amor incondicional se faz necessário nesse clima afetivo da psicoterapia, um amor desinteressado, que não deseje mudanças ou crie expectativas sobre o outro, mas o aceite tal como ele é, para que ele mesmo possa começar a se aceitar, a se amar, e possa surpreender a si mesmo e ao terapeuta, pelas suas próprias escolhas e transformações. A expressão desse amor não se faz, contudo, em palavras, mas em ações, numa postura que garanta reconhecer, respeitar e aceitar o que o outro coloca, e partilhar com ele essa jornada, sem conduto concordar ou discordar, mas fazendo que o próprio cliente reconheça o significado das expressões que ele mesmo comunica. Compreensão empática, segundo o autor, é atingir os significados que se encontram no mundo subjetivo do cliente.

Rudio coloca como importante, embora não obrigatório, que o terapeuta se submeta ao processo psicoterápico para construir sua própria congruência, sendo algo que não se pode fingir, sendo-o-que-se-é, o que vai além do papel profissional. Para que não haja o contágio emocional, onde o indivíduo não sabe reconhecer ou separar o que é seu e o que é do outro, ocorrendo uma identificação empática ao invés de uma compreensão empática.

A orientação não diretiva tira o terapeuta de uma posição mais importante ou superior ao cliente, e o coloca numa mesma linha horizontal, na igualdade de uma relação que respeita e aceita o outro tal como ele é, dando-lhe a oportunidade de se ouvir, se descobrir, se conhecer, ao mesmo tempo em que o terapeuta está ao seu lado, proporcionando um ambiente que o permita ser o que ele é, e se expressar livremente, sem medos ou repressões. Através do clima afetivo que o profissional lhe oferece, da consideração positiva e amor incondicional que assume em sua postura, o indivíduo aprende a se aceitar, a enxergar aspectos em si que antes não lhe eram conscientes, ou mesmo lhe causavam vergonha ou aversão. Através da compreensão empática do terapeuta o indivíduo aprende a se amar, a reorganizar a imagem de si mesmo, e só a partir daí ele é capaz de caminhar para mudanças significativas que o levem a autonomia e auto-realização. O terapeuta é um “companheiro de viagem, atento e amigo, que vai colocando setas no caminho, mas setas que foram oferecidas pelo próprio cliente” (p. 91).

Com as respostas compreensivas o terapeuta busca comunicar através de suas palavras tudo que foi expresso pelo cliente, como se estivesse decifrando ou decodificando seu conteúdo, respostas estas sempre consideradas a posteriori e não a priori. Nesse sentido, a busca da verdade, do que é melhor para a pessoa, de qual direção ela deve tomar, se encontra nela mesma, e fazer parte deste processo, desta descoberta, desta possível tomada de mudanças, deve ser a experiência mais enriquecedora nessa área psicoterápica, tanto para o cliente quanto para o profissional. O conhecimento da terapia não diretiva transforma ambos os lados.


Esse texto é dedicado em forma de agradecimento as aulas de “Teorias e Sistemas Psicológicos II (Fenomenologia)” da Profª Drª Ana Rita da Fonseca.


Tiago de Sousa Medeiros


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA


RUDIO, Franz Victor. Orientação não-diretiva: na educação, no aconselhamento e na psicoterapia. Rio de Janeiro: Editora Vozes Ltda, 1975, 110 p.

0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page