Freud, em 1905, através de seu texto “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, vai discutir a multiplicidade de constituições sexuais, e questionar a concepção de que existem apenas o homem e a mulher, e de que a única relação possível seja a heterossexual. Nesta obra ele vai afirmar a existência da pulsão sexual na infância (que tanto despertou críticas e resistências por parte da sociedade que sentiu-se ofendida com o conceito de “sexualidade infantil”), descrevendo os estágios do desenvolvimento psicossexual e sua reverberação nas formas de nos relacionarmos na vida adulta. Em relação a diversidade sexual, ele vai discutir nesta obra as “perversões sexuais” e as diferentes formas que o ser humano encontra de satisfazer-se, além dos padrões considerados naturais ou aceitos socialmente.
Através da discussão e dos questionamentos sobre a complexidade da sexualidade humana, propomos a análise dos dois volumes do filme “Ninfomaníaca” (2013), escrito e dirigido pelo dinamarquês Lars von Trier, e que se mostra muito pertinente frente a explicitação e o diálogo sobre o tema durante o longa-metragem, ao abordar casos pouco discutidos, como por exemplo, a pedofilia e a assexualidade. Você já imaginou como seria se a forma de viver a sua sexualidade fosse considerada um crime ou uma patologia? E se o modo como você encontra gozo e prazer fosse julgado imoral e condenado socialmente? E se você não pudesse se satisfazer plenamente sem causar dano a outrem ou trazer prejuízos significativos a si mesmo? Como as pessoas que possuem parafilias vivenciam sua libido? Existe tratamento ou cura para as formas que são criminalmente imputáveis?
Embora no decorrer do texto citemos diferentes disciplinas, como a Medicina, a Neurociência, a Antropologia e o Direito, baseamos a análise e as interpretações com o maior referencial da Psicanálise, reconhecendo uma certa necessidade de diálogo interdisciplinar devido a complexidade do tema e a escassez de produções acadêmicas sobre o assunto.
Ninfomaníaca (2013) é um filme escrito e dirigido por Lars von Trier, que conta a história de uma mulher, Joe (interpretada pelas atrizes Charlotte Gainsbourg e Stacy Martin), que possui ninfomania, e logo no início da trama é socorrida por um senhor chamado Seligman (Stellan Skarsgard), que a encontra desacordada no meio da rua após ter sido violentada. Seligman acolhe Joe (que se recusa a ir ao hospital) em sua casa, e questiona o que aconteceu, dando início a um diálogo através do qual a protagonista conta sua história e as maneiras que encontrou de vivenciar sua sexualidade, levando-a até aquele momento. Para melhor compreendermos e analisarmos a trama, iremos intercalar a discussão e interpretações com o estudo e a apresentação de conceitos teóricos.
PERVERSÕES SEXUAIS (PARAFILIAS)
Freud, em seu texto “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade” (1905), argumenta sobre a multiplicidade de constituições sexuais, questionando a concepção de que existem apenas o homem e a mulher, e de que a única relação possível seja a heterossexual. Ele cita a existência do hermafroditismo (pessoas que nascem com órgãos sexuais tanto masculinos como femininos), e conceitua o “Hermafroditismo ou hibidrismo psíquico” (esse não relacionado aos órgãos genitais propriamente), considerando a hipótese de uma predisposição bissexual inata em todos os seres humanos.
Freud define objeto sexual como a pessoa ou coisa de quem provém a atração sexual, e alvo sexual como a ação para a qual a pulsão impele. O objeto sexual considerado “normal” na vida adulta seria, portanto, uma pessoa do sexo oposto, e o alvo sexual “natural” seria o encontro das genitálias através da penetração (pênis/vagina), cujo ato “leva à descarga da tensão sexual e à extinção temporária da pulsão sexual (uma satisfação análoga à saciação da fome).” (p. 92). Ele argumenta que, tanto as pessoas heterossexuais como as homossexuais, podem ter múltiplos alvos sexuais, como o sexo anal, oral e a masturbação.
“A teoria popular sobre a pulsão sexual tem seu mais belo equivalente na fábula poética da divisão do ser humano em duas metades - homem e mulher - que aspiram a unir-se de novo no amor. Por isso causa grande surpresa tomar conhecimento de que há homens cujo objeto sexual não é a mulher, mas o homem, e mulheres para quem não o homem, e sim a mulher, representa o objeto sexual.” (p. 84).
A essas pessoas que sentem atração pelo mesmo sexo Freud denomina de invertidos, que podem ser: absolutos (que não sentem nenhum atração pelo sexo oposto), anfígenos ou hermafroditas sexuais (cujo objeto sexual pode ser tanto o homem quanto a mulher, faltando à inversão o caráter de exclusividade) e ocasionais: “em certas condições externas, dentre as quais destacam-se a inacessibilidade do objeto sexual normal e a imitação, elas podem tomar como objeto sexual uma pessoa do mesmo sexo e encontrar satisfação no ato sexual com ela.” (p. 85). Ele vai discutir as relações temporais do traço de inversão, que pode manifestar-se desde a mais tenra infância, na época da puberdade, ou mesmo na fase adulta após um longo período de relações com o sexo oposto.
Freud explica que existem desvios tanto em relação ao objeto sexual quanto ao alvo sexual convencionais. É importante salientar que a presença desses desvios, segundo o autor, não possui correlação direta com a existência de transtornos mentais. Em relação aos desvios com respeito ao alvo sexual, Freud cita o uso das mucosas dos lábios e da boca no contato com as genitálias (sexo oral), orifício anal (sexo anal, que segundo ele não é prática exclusiva dos homossexuais masculinos, mas ocorre também com frequência nas relações heterossexuais), fetichismo (quando o objeto sexual é substituído por uma parte do corpo ou por um objeto que mantém uma relação demonstrável com a pessoa a quem substitui), voyeurismo (prazer ao ver estímulos sexuais ou o próprio ato sexual praticado por outros), sadismo (prazer em infligir dor ao objeto sexual), e masoquismo (satisfação frente ao padecimento de dor física ou anímica advinda do objeto sexual). Com relação ao desvio referente ao objeto sexual, Freud cita aqueles que sentem atração sexual por pessoas imaturas (pedofilia) e aqueles cuja atração sexual ultrapassa a barreira da espécie (zoofilia). Freud cita também casos em que a pulsão sexual se volta para finalidades que superam as resistências do asco, da vergonha ou da dor, como por exemplo, ao lidar com excrementos (coprofilia) ou abusar de cadáveres (necrofilia).
Ele define, pois, perversões sexuais como “transgressões anatômicas quanto às regiões do corpo destinadas à união sexual”, ou “demoras nas relações intermediárias com o objeto sexual, que normalmente seriam atravessadas com rapidez a caminho do alvo sexual final.” (p. 92-93). Em relação ao sadismo e o masoquismo, Freud considera que essas são as formas mais frequentes das perversões, sendo que podemos associá-los as atitudes ativa e passiva numa relação sexual. “O sadismo e o masoquismo ocupam entre as perversões um lugar especial, já que o contraste entre atividade e passividade que jaz em sua base pertence às características universais da vida sexual.” (p. 98).
O sádico sexual sente prazer em ver seu objeto sexual submisso, humilhado ou em sofrimento. “O conceito de sadismo oscila, na linguagem corriqueira, desde uma atitude meramente ativa ou mesmo violenta para com o objeto sexual até uma satisfação exclusivamente condicionada pela sujeição e maus-tratos a ele infligidos. Num sentido estrito, somente este último caso extremo merece o nome de perversão.” (p. 98). Já o masoquismo abrange a satisfação em relação a própria dor ou desprazer infligido pelo objeto sexual, sendo que Freud o considera como uma continuação do sadismo que se volta contra o próprio indivíduo. Segundo ele: “toda dor contém em si mesma a possibilidade de uma sensação prazerosa.” (p. 98). Ele vai citar autores que consideram esse fator agressivo da libido (da agressão mesclada à pulsão sexual), como resíduo de desejos canibalísticos, de uma época mais primitiva do ser humano em que havia uma necessidade de dominação sobre o outro.
Ambas as parafilias, sadismo e masoquismo, ou ainda que ambas presentes, sadomasoquismo, têm seu modelo em relações objetais que são construídas na fase anal do desenvolvimento psicossexual. Seguindo a trilha da fisiologia, de retenção e expulsão das fezes e pelos conflitos de comportamentos adquiridos nesta fase (como, por exemplo educação, limpeza e ordem), Kusnetzoff (1982, p. 45) indica que destruir objetos (expulsão) ou controlá-los (retenção) são tendências que proporcionam fontes de prazer e que constituem a possibilidade de propriedade privada e de poder sobre um objeto externo, podendo gratificá-lo ou frustrá-lo. Estes modelos de relação adquiridos serão modelos de vínculos que compõe a posição sádica em fases posteriores do desenvolvimento.
Sobre o masoquismo, Freud (1924) o considera como uma condição para a excitação sexual (masoquismo erógeno), o prazer na dor, que deve ter um fundamento tanto biológico quanto constitucional, como uma expressão de uma natureza passiva, denominação esta que é uma valorização amorosa antagônica, típica da transição entre as fases oral e fálica, que compõe a fantasia de julgar/ser julgado ou dominar/ ser dominado (Kusnetzoff, 1982); também como sentimento de culpa e necessidade inconsciente de punição (masoquismo moral), não importando se esta vem ou não da pessoa amada, e cuja fonte é um resíduo de instinto agressivo que não se voltou ao mundo exterior ou dele retornou, e se volta novamente contra o próprio indivíduo; e como uma forma de desempenho feminino num jogo relacional (masoquismo feminino), que tem seu equivalente psíquico como ser possuído, castrado e dar à luz um produto pertencente ao parceiro ou a quem se relaciona. Freud (1924) diz não haver nada importante que ocorra no organismo que não forneça componentes para a excitação do instinto sexual e “a excitação por dor ou desprazer deve ter igual consequência. Esta excitação libidinal que acompanharia a tensão de dor e desprazer seria um mecanismo fisiológico infantil (...) e teria em diferentes constituições sexuais, graus diversos de desenvolvimento; em todo caso, proporcionaria a base fisiológica sobre a qual depois se constrói na psique o masoquismo erógeno.” (FREUD, 1924, p. 171).
Em relação a pulsão sadomasoquista, Freud escreve: “A particularidade mais notável dessa perversão reside, porém, em que suas formas ativa e passiva costumam encontrar-se juntas numa mesma pessoa. Quem sente prazer em provocar dor no outro na relação sexual é também capaz de gozar, como prazer, de qualquer dor que possa extrair das relações sexuais. O sádico é sempre e ao mesmo tempo um masoquista, ainda que o aspecto ativo ou passivo da perversão possa ter-se desenvolvido nele com maior intensidade e represente sua atividade sexual predominante.” Freud considera o sadismo e o masoquismo como pares de opostos, que podem estar presentes em uma mesma pessoa como formas ativa e passiva, como a “oposição entre masculino e feminino que se combina na bissexualidade.” (p. 98). Ele cita que toda perversão ativa tende a ser acompanhada de sua contrapartida passiva, como por exemplo, ao considerar que quem é exibicionista, pode ser ao mesmo tempo voyeur; sendo que uma dessas inclinações tende a assumir um papel prevalente.
Freud considera como imprópria a utilização “reprobatória” da palavra perversão, visto que muitos dos exemplos citados podem ser encontrados em maior ou menor grau como parte da vida sexual de muitas pessoas, sendo imprecisa a fronteira que diferencia uma mera variação de sintomas patológicos. O problema não estaria, assim, na escolha do objeto sexual, mas na relação que a pessoa estabelece com ele. O sintoma patológico se estabelece, pois, quando percebemos nessa escolha as características de “exclusividade” e “fixação” (p. 99).
Nesse sentido, de que nem tudo que foge ao padrão sexual considerado normal ou natural, é patológico ou tão incomum como supomos, podemos considerar alguns exemplos e explicações dadas pelo pai da Psicanálise. Em relação ao fetichismo, ele afirma que um certo grau de fetiche “costuma ser próprio do amor normal, sobretudo nos estágios de enamoramento em que o alvo sexual normal é inatingível ou sua satisfação parece impedida.” Um caso, segundo ele discute, só se torna patológico quando “o anseio pelo fetiche se fixa, indo além da condição mencionada, e se coloca no lugar do alvo sexual normal, e ainda, quando o fetiche se desprende de determinada pessoa e se torna o único objeto sexual.” (p. 95), geralmente associado a alguma conexão simbólica que não costuma ser consciente para a pessoa.
Embora Freud considere que a “anormalidade” expressa por uma pessoa em outras dimensões de sua vida costuma ter um fundo de conduta sexual fora do comum, não é coerente afirmar, segundo ele, que pessoas que demonstram perversões sexuais possuem anormalidades graves ou doenças mentais. Ele cita que muitas pessoas podem apresentar uma conduta anormal apenas na dimensão sexual (tomando o termo anormal como “fora do comum” ou “diferente”, e não como patológico).
Segundo Alves e Sousa (2004), na década de 80, o termo perversão sexual passa a ser substituído por parafilia (do grego para “fora do”, filia “amor”) na literatura médico psiquiátrica. Os autores questionam o moralismo acerca da sexualidade, argumentando que a Psicanálise critica uma visão reducionista sobre o assunto, apresentando a perversão enquanto “conjuntura estrutural do ser humano”. Eles afirmam que a grande maioria dos parafílicos não possui comorbidade psiquiátrica, como ao citar aqueles que infringem a lei: “Os criminosos sexuais parafílicos têm inteira capacidade de entender o caráter ilícito do ato praticado já que o transtorno não lhes confere perturbação da consciência, distorção perceptiva ou do juízo da realidade.” (p. 87).
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), o termo parafilia representa “qualquer interesse sexual intenso e persistente que não aquele voltado para a estimulação genital ou para carícias preliminares com parceiros humanos que consentem e apresentam fenótipo normal e maturidade física”, sendo definido também como “qualquer interesse sexual maior ou igual a interesses sexuais normofílicos” (p. 685).
Ballone (2005) argumenta que culturalmente se reconhece o sexo convencional como sendo monogâmico, heterossexual, coital e com finalidade procriativa. Sendo que ele considera o termo “convencional” ao invés de “normal” devido ao fato da interpretação errônea que atribui ao “não normal” o status de “patológico”. Segundo o autor, uma parafilia está configurada quando “há necessidade de se substituir a atitude sexual convencional por qualquer outro tipo de expressão sexual, sendo este substitutivo a preferida ou única maneira da pessoa conseguir excitar-se. Assim sendo, na Parafilia os meios se transformam em fins, e de maneira repetitiva, configurando um padrão de conduta rígido o qual, na maioria das vezes, acaba por se transformar numa compulsão opressiva que impede outras alternativas sexuais.” (p. 02). Ele discute a importância de se distinguir a parafilia (que é uma característica da personalidade), do ato de um “delinquente sexual”, que é um transgressor das normas jurídicas, e, não necessariamente, possui uma parafilia ou um transtorno parafílico.
Lopes (2018) discute a distinção entre parafilia e transtorno parafílico, argumentando que todo transtorno parafílico possui uma parafilia, mas nem toda parafilia é um transtorno parafílico; como afirma: “É bem comum em situações clínicas, o sujeito possuir várias parafilias e não possuir o transtorno parafílico, o que pode ocorrer também, do mesmo possuir uma única parafilia e possuir tal transtorno. O que vale ser ressaltado é o impacto que tal desejo traz na vida do sujeito. Caso determinada parafilia traga um determinado sofrimento pessoal, social, afetivo, profissional, dentre outros, podemos classificar assim como um transtorno parafílico” (p. 05).
“Um transtorno parafílico é uma parafilia que está causando sofrimento ou prejuízo ao indivíduo ou uma parafilia cuja satisfação implica dano ou risco de dano pessoal a outros. Uma parafilia é condição necessária, mas não suficiente, para que se tenha um transtorno parafílico, e uma parafilia por si só não necessariamente justifica ou requer intervenção clínica”. (ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA, 2013, p. 685).
Segundo o DSM-5, não é raro uma pessoa manifestar duas ou mais parafilias, sendo que entre os transtornos parafílicos apresentados pelo manual, encontramos: transtorno voyeurista, transtorno exibicionista, transtorno frotteurista (tocar ou esfregar-se em indivíduo que não consentiu), transtorno do masoquismo sexual, transtorno do sadismo sexual, transtorno pedofílico, transtorno fetichista e transtorno transvéstico (vestir roupas do sexo oposto visando excitação sexual); considerando também que existem muitos transtornos parafílicos além dos categorizados, na definição “Outro Transtorno Parafílico Especificado”, como por exemplo: “excitação sexual recorrente e intensa envolvendo escatologia telefônica (telefonemas obscenos), necrofilia (cadáveres), zoofilia (animais), coprofilia (fezes), clismafilia (enemas) ou urofilia (urina) que tenham estado presentes durante pelo menos seis meses causando sofrimento intenso ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo” (p. 705).
Na 10ª versão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID 10), os transtornos parafílicos estão classificados na sessão F: “Transtornos mentais e comportamentais”, na categoria F65 como “Transtornos da Preferência Sexual”, sendo que em sua mais recente versão, CID 11, eles estão classificados na sessão nº 6, como “Transtornos mentais, comportamentais ou do neurodesenvolvimento”, constando na sessão 6D “Distúrbios parafílicos” (Paraphilic disorders). O DSM-5 argumenta que alguns desses transtornos parafílicos implicam ações para sua satisfação que, devido à característica nociva e ao dano potencial a outros, são classificadas como “delitos criminais”. Vale salientar, portanto, a diferença fundamental entre uma parafilia e um transtorno parafílico, que é o sofrimento clinicamente significativo causado em diversas áreas da vida do indivíduo e/ou de outras pessoas.
Podemos perceber no filme Ninfomaníaca algumas das perversões citadas acima, mas antes de adentrarmos a discussão sobre o enredo da trama e a estória dos personagens principais, faz-se importante considerar os estudos de Freud sobre as possíveis origens desses desvios sexuais e o desenvolvimento da sexualidade na infância.
A SEXUALIDADE INFANTIL
Em seu livro “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade” (1905), Freud questiona a afirmação de que a pulsão sexual está ausente na infância e só se manifesta no período da puberdade. Teoria através da qual ele encontrou muita resistência pela sociedade conservadora da época do final do século XIX, ao afirmar a existência da sexualidade infantil em suas diferentes formas de expressão, num período em que as crianças eram vistas como seres assexuados, símbolos da “pureza”. Freud considerou muitas demonstrações acerca da atividade sexual precoce em crianças pequenas, como, por exemplo, atividades autoeróticas, mais observáveis a partir dos 3 ou 4 anos. Segundo Kusnetzoff (p.50), a exploração do próprio corpo é uma atividade substitutiva de anteriores satisfações aprendidas e obtidas através de contato com outras pessoas. Antes mesmo de a criança chegar no nível de atividade masturbatória sobre os órgãos genitais, esta já terá aprendido que diversas atividades sobre o corpo podem produzir satisfações e alívios de tensão, que podem até mesmo gerar efeitos no mundo exterior ou serem gerados por ele. Como veremos, diversas são as sensações prazerosas sobre diversas zonas erógenas durante o desenvolvimento psicossexual, sensações que servirão de protótipo de uma satisfação substitutiva que serve como modelo de exploração e reconhecimento do próprio corpo (KUSNETZOFF, p. 51). Tal atividade é fundamental para a formação do narcisismo, ponto estruturante da personalidade psíquica e fundamental, uma vez que o Ego não existe desde o nascimento, mas o autoerotismo faz com que o corpo obtenha uma inteireza psíquica. Segundo Freud, o ser humano possui uma amnésia infantil que “encobre os primeiros anos da infância” (p. 107); entretanto, essas impressões que esquecemos deixam “profundos rastros” em nosso desenvolvimento e em nossa posterior vida sexual.
A pulsão sexual na infância, segundo Freud, não é voltada a “funções reprodutoras” nem está dirigida a outra pessoa, mas é essencialmente auto-erótica, ou seja, se satisfaz no próprio corpo. Tais pulsões são pulsões parciais, espalhadas por diversas partes do corpo do infante, sem ligação entre si e não obedecendo à uma unidade integrada (o Ego, que apenas irá se fundamentar mais tarde), mas sim que podem se ligar a uma determinada zona erógena, que podem ser diferentes em diversas fases do desenvolvimento psicossexual, sendo “enfileiradas” até que finalmente se submetam à primazia do falo, organização que se manterá pelo resto da vida. “A finalidade do desenvolvimento sexual normal no adulto é que o prazer seja encontrado no outro, num objeto sexual alheio, cujas pulsões parciais convertem para a zona erógena genital e a obtenção do prazer serve à função reprodutora, partindo do egoísmo da infância para o altruísmo do pleno desenvolvimento sexual da vida adulta.” (Freud, 1914)
Segundo Freud, zona erógena é uma parte da pele ou da mucosa em que determinada estimulação rítmica provoca sensações prazerosas. Essa “propriedade erógena” está mais ligada a determinadas partes do corpo, pensamento ao qual Freud aponta o conceito de “zonas erógenas predestinadas”. Existem, portanto, fases da organização pré-genital (quando as zonas genitais não são dominantes), que Freud classificou como fases: oral, anal, fálica, de latência e, por fim, a genital; conforme sua teoria do desenvolvimento psicossexual.
Na primeira fase encontramos o prazer na zona oral, que Freud também considera como canibalesca, em que a pulsão sexual ainda não se separou da nutrição. Nessa fase a criança obtêm a primeira sensação de prazer através do sugar o leite que provém do seio materno, sensação de satisfação que buscará revivenciar pelo resto da vida. Nessa fase, que costuma ir do nascimento até os 12/18 meses, as crianças tendem a levar tudo o que pegam a boca, e realizam o “chuchar” como uma busca da primeira sensação prazerosa, como podemos observar ao chuparem o dedo e/ou a chupeta. “Nem todas as crianças praticam esse chuchar. É de se supor que cheguem a fazê-lo aquelas em quem a significação erógena da zona labial for constitucionalmente reforçada.
Persistindo essa significação, tais crianças, uma vez adultas, serão ávidas apreciadoras do beijo,tenderão a beijos perversos ou, se forem homens, terão um poderoso motivo para beber e fumar. Caso sobrevenha o recalcamento, porém, sentirão nojo da comida e produzirão vômitos histéricos. Por força da dupla finalidade da zona labial, o recalcamento se estende à pulsão de nutrição.” (p. 111).
O alvo sexual nessa fase, segundo Freud, consiste na “incorporação do objeto”, o que, posteriormente com o fenômeno de identificação, desempenhará um importante papel psíquico (p. 121). Através do mito da horda primeva que Freud investiga na obra Totem e Tabu (1913) podemos encontrar o equivalente psíquico da atividade canibalesca, quando os filhos de uma pai poderoso e tirano o assassinam e se alimentam de sua carne. Ao fazerem isso, se identificam com esta figura de poder imperioso e instauram um ritual de expiação da culpa pelo crime cometido. A identificação introjetada na fase oral é fundamental para a fundamentação do Ego, sendo tal fase e processos equivalentes ao que Lacan (1986) denomina Estágio do Espelho.
A segunda fase é considerada por Freud como a fase sádico-anal, que dura entre os 2 e 4 anos aproximadamente, em que a zona erógena passa a ser a região do ânus. Neste período a criança passa a adquirir o controle dos esfíncteres e a exercer domínio sobre o momento em que as fezes saem de dentro de si; porem não constitui apenas controle esfincteriano. “Esse serve de modelo para o controle motor em geral, sensações de domínio, prazer na expulsão ou retenção, etc” (KUSNETZOFF, 1982). Seu equivalente psíquico é demonstrado pelo comportamento de reter a atividade de expelir os excrementos quando a criança passa por algum conflito psíquico ou quando usa das fezes como uma forma de gratificação aos pais, como presentes que se ofereçam ou se recusam. “As crianças que tiram proveito da estimulabilidade erógena da zona anal, denunciam-se por reterem as fezes até que sua acumulação provoca violentas contrações musculares e, na passagem pelo ânus, pode exercer uma estimulação intensa na mucosa.” (p. 114). Nessa fase as crianças vão adquirindo conceitos de asseio, sendo que dificuldades nesse período podem posteriormente indicar adultos com problemas de higiene, seja pelo seu excesso ou ausência. Também os dejetos ocupam papel fundamental na fantasia da criança quando esta começa a obter o controle de seus esfíncteres e de, por assim dizer, expulsar ou expelir (ou reter) o que ela própria produz. Se suas relações com o mundo exterior são de angústia, tenderá a ter como maus suas produções fecais e, para expressar agressividade, fará do ambiente externo um depositário dessas agressões por atingi-lo ou sujá-lo com seus excrementos.
A terceira fase é a fálica, entre os 4 e 6 anos aproximadamente, na qual a zona erógena passa a ser os genitais. Nesse período a criança geralmente se apega ao genitor do sexo oposto e, posteriormente, se identifica com o genitor do mesmo sexo, encerrando assim seu complexo de Édipo e instaurando o Super Ego, responsável pela internalização de figuras de autoridade, proibições e limites impostos por seus pais e pela cultura. Nessa fase a fantasia é da possibilidade de castração, em vista da consciência das diferenças anatômicas dos genitais da criança e dos adultos e em nome da qual se abre mão de seu objeto de amor primário e se identifica com o progenitor do mesmo sexo. Segundo Freud (1927) se a criança acaba por fazer um compromisso entre a percepção indesejada de uma mãe castrada e o desejo da mãe fálica, à qual não quer renunciar, outro objeto é eleito para receber o mesmo interesse do falo inexistente, sustentado pelo horror e negação à castração própria. Este objeto constituirá o fetiche, podendo ser um objeto ligado à cena traumática, ou uma parte isolada do corpo como os pés ou cabelos.
Depois disso, a criança entra no período de latência, que vai dos 6 anos até o início da puberdade. Essa é uma fase mais "tranquila", não possuindo uma zona erógena determinada; em que a criança sublima sua pulsão sexual dando-lhe vazão em atividades artísticas e escolares, que tanto serão importantes para o seu desenvolvimento cultural e social.
A última fase, destarte, é a genital, que tem início na adolescência, com as pulsões sexuais ressurgindo com intensa força e se dirigindo a um objeto sexual alheio. Nessa fase temos o desenvolvimento dos órgãos genitais internos e externos, que passam a “descarregar produtos sexuais” ou “recebe-los para promover a formação e um novo ser vivo” (p. 128). Ocorre então a subordinação de todas as pulsões parciais das zonas erógenas ao “primado da zona genital.” Nesse período o desenvolvimento entre os sexos passa a diferir bastante.
Compreendemos, portanto, que o alvo sexual infantil se modifica conforme seu desenvolvimento, passando pelas zonas erógenas e períodos citados, até desembocar na fase genital que se constitui na vida adulta convencional: “a pulsão sexual do adulto nasce mediante a conjugação de diversas moções da vida infantil numa unidade, numa aspiração com um alvo único” (p. 142).
Freud argumenta que a tensão da excitação sexual vai trazer em si uma pressão, um desprazer, que impulsiona o indivíduo a busca pela satisfação. Nesse momento, todas as zonas erógenas são usadas para proporcionar “um certo aumento do prazer; este leva a um acréscimo de tensão que, por sua vez, tem de produzir a energia motora necessária para levar a cabo o ato sexual.” (p. 129). Após a descarga dessa tensão sexual, ocasionada pela “expulsão das substâncias sexuais”, se atinge o prazer em sua intensidade mais elevada (orgasmo), prazer efêmero, que, após alcançado, a tensão da libido se extingue temporariamente. O prazer produzido pela excitação das zonas erógenas é o que Freud denomina de “pré-prazer”, que contribui para o aumento da tensão e o alcance do “prazer maior”. No entanto, esse pré-prazer pode ser fixado e tomar o lugar do “alvo sexual normal”.
Freud considera que existem certas relações intermediárias a caminho do coito que são reconhecidas como “alvos sexuais preliminares”, que trazem prazer e intensificam a excitação, como por exemplo, o beijo, cujo encontro das mucosas labiais tem um valor sexual em diversas culturas, embora sejam partes do corpo que não pertencem ao aparelho sexual, mas ao aparelho digestivo.
Ele afirma, pois, que a configuração da vida sexual “normal”, bem como os seus desvios, são determinados pelas manifestações infantis da sexualidade. Ao discorrer sobre as primeiras sensações de prazer proporcionadas a criança pela mãe no contato com o leite através do seio, Freud escreve que “para a criança, a amamentação no seio materno toma-se modelar para todos os relacionamentos amorosos. O encontro do objeto é, na verdade, um reencontro.” (p. 136). Ele enfatiza, então, a importância do relacionamento da criança com os genitores para o seu desenvolvimento e as posteriores relações que terá em sua vida:
“O homem, sobretudo, busca a imagem mnêmica da mãe, tal como essa imagem o dominou desde os primórdios da infância; e está em perfeita harmonia com isso que a mãe, ainda viva, oponha-se a essa reedição dela mesma e a trate com hostilidade. Em vista dessa importância do relacionamento infantil com os pais para a escolha posterior do objeto sexual, é fácil compreender que qualquer perturbação desse relacionamento terá as mais graves conseqüências para a vida sexual na maturidade; também ao ciúme dos amantes nunca falta uma raiz infantil, ou pelo menos um reforço infantil. As desavenças entre os pais ou seu casamento infeliz condicionam a mais grave predisposição para o desenvolvimento sexual perturbado ou o adoecimento neurótico dos filhos.” (p. 139-140).
Através do filme Ninfomaníaca, notamos que a sexualidade da personagem Joe é percebida em seus primeiros anos de vida e nas brincadeiras com uma menina da mesma idade (quando esfregam a vagina no piso do banheiro molhado); ela mesma cita que descobriu sua vagina aos 2 anos; sendo que sua compulsão sexual já se manifesta no início de sua adolescência, como na cena do trem em que ela faz uma aposta com sua amiga procurando ter relações com vários parceiros durante a viagem. Não podemos, no entanto, discutir a forma como a relação que ela mantinha com seus genitores afetou seu posterior comportamento hipersexual. Percebemos que ela possuía um relacionamento afetuoso com o pai, porém conflituoso com a mãe, a qual chama em um determinado momento de “vadia”. É interessante salientar, todavia, uma cena em que ela relata uma lembrança onde, ainda criança, iria passar por um procedimento cirúrgico, e, estando sozinha na maca no período pré-operatório, sente falta da genitora, e não do genitor a quem mais ama.
Freud argumenta que a criança “transforma sua libido em angústia quando não pode satisfazê-la; e inversamente, o adulto neurotizado pela libido insatisfeita comporta-se como uma criança em sua angústia.” (p. 138). Ele também afirma que a precocidade em que ocorre a interrupção do período infantil de latência pode dificultar o “desejável domínio posterior da pulsão sexual pelas instâncias anímicas superiores” e “aumentar o caráter compulsivo em busca da satisfação sexual” (p. 148). Sendo uma das razões pelas quais os educadores temem abordar esses fenômenos, trabalhando na construção de “forças defensivas morais à custa da sexualidade” (p. 110), por medo de que uma atividade sexual precoce torne a criança “ineducável.” O importante, portanto, através do texto abordado, é reconhecer a importância da infância e da relação das crianças com seus genitores ou aqueles que cumprem as funções materna e paterna (independente de serem os pais biológicos), para o posterior desenvolvimento do sujeito.
NINFOMANIA
Motomura (2011) define a ninfomania como um “apetite sexual excessivo”, sendo um termo atribuído a mulheres; no caso dos homens, o conceito seria satiríase. Portolann (2016) vai discutir a origem dos termos ninfomania e satiríase, originando-as do conceito de erotomania (delírio de ser amado/prática do amor físico em excesso); conforme escreve: “Já na metade do século XVIII, a erotomania passou a ser caracterizada como uma forma de loucura por um excesso de apetite sexual levando à crença de que o sexo é o objetivo supremo que escraviza a pessoa à sua prática. Neste segundo estágio, o erotomaníaco não estaria mais numa relação platônica, apaixonado por alguém específico, mas totalmente entregue ao desejo do sexo físico incontrolado. Intrinsecamente a isso, neste mesmo período, a ninfomania e a satiríase tornaram-se protótipos da erotomania, sendo até listados em todas as grandes nosologias do século XVIII, em função da sua fixação com o desejo carnal.” (p. 12). Na trama analisada, Seligman vai citar Valéria Messalina, esposa do imperador romano Cláudio, como a maior ninfomaníaca conhecida da história.
Não encontramos, entretanto, o termo ninfomania ou satiríase nos classificações internacionais de doenças e agravos à saúde. A 10ª versão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID 10), traz o termo “Apetite sexual excessivo” conforme o código F52.7, relacionado a “Disfunção sexual, não causada por transtorno ou doença orgânica”. Já em sua versão mais recente, CID 11, não encontramos nenhum termo específico a esse quadro.
Messina (2015) vai definir como Impulso Sexual Excessivo (ISE) o quadro que abrange diversas definições como: compulsão sexual, dependência de sexo e comportamento hipersexual. Características do ISE incluem: comportamentos de risco que decorrem de impulsividade e falta de controle, aumento de chances de exposição ao HIV e DST’s (devido ao sexo casual com múltiplos parceiros sem prevenção), grande parte do tempo dispendido com fantasias sexuais, podendo estar presente a masturbação excessiva e o consumo demasiado de pornografia. A autora vai discutir que as conseqüências do ISE podem trazer diversos prejuízos à vida do indivíduo, como por exemplo, o comprometimento social e familiar decorrente da negligência de responsabilidades em detrimento da satisfação sexual; como podemos perceber no momento em que a personagem Joe deixa seu filho pequeno em casa sozinho e acaba sendo posteriormente abandonada pelo marido que a obriga a escolher entre sua família e seu desejo sexual. Nesse ponto da estória, ela procurava ser atendida por um homem sádico devido a um período de ausência de sua satisfação sexual. É interessante considerar que Joe expressa que sentia-se desmascarada quando olhava para o filho, e ela passa a depositar posteriormente uma pensão para ele de forma anônima (quando Jeron o entrega a adoção), mantendo um cuidado indireto.
Numa perspectiva da Neurociência, Messina define o ISE como uma “doença crônica do sistema de recompensa do cérebro” (p. 24), que pode apresentar características patológicas semelhantes a dependência por substâncias psicoativas (SPA), sendo que o sujeito pode apresentar sintomas de tolerância e abstinência. Como podemos perceber durante a trama, em que Joe passa a ter cada vez mais parceiros para satisfazer-se (chegando a 10 homens diferentes por dia, comparando suas características com as diferentes notas musicais). Segundo a psiquiatra Fernanda Piotto Frallonardo, há relatos na literatura médica de pacientes que tiveram até 50 relações sexuais em um dia (apud MOTOMURA, 2011). Percebemos também os sintomas de abstinência mais ao final da trama, quando Joe passa a apresentar febre e câimbras decorrente da ausência de atividade sexual. Ausência que ela também atribui a feridas em sua virilha decorrente dos constantes abusos sexuais, que a impediam até mesmo de se masturbar. Percebemos então outro fator discutido que é a presenta de uma DST (doença sexualmente transmissível), embora não especificada no filme.
Messina (2015) argumenta que as pessoas com IES podem apresentar diferenças no córtex pré-frontal (afetando o controle dos impulsos), entre outras estruturas cerebrais, bem como uma possível redução da produção de neurotransmissores como a serotonina e a dopamina. Em relação as causas de sua origem, a autora vai discutir que elas podem ser multifatoriais, entre os quais ela cita: predisposições genéticas, podendo ser a própria impulsividade uma característica hereditária; aspectos vivencias da primeira infância (traumas, abusos), sendo que pais que possuem comportamentos compulsivos (mesmo em outras áreas que não seja a sexual propriamente, como compras ou uso de SPA por exemplo) podem afetar essa posterior compulsão na dimensão sexual do filho(a). Segundo a autora: “O ISE tem início na adolescência, e na maior parte dos casos manifesta-se de modo crônico e progressivo, podendo às vezes apresentar-se de forma episódica e multifásica. Além disso, quanto mais tempo o indivíduo leva para buscar ajuda, mais cresce e intensificam-se os sintomas” (p. 19-20); sendo comum diagnósticos comórbidos com transtornos de humor e ansiedade.
Outra característica importante apontada pela autora é a persistência dos comportamentos impulsivos e de risco apesar das conseqüências negativas, argumentando entre as características que definem esse desejo a sua insaciabilidade. Não necessariamente uma pessoa que têm diversos parceiros sexuais se satisfaz em todos os atos. Uma ninfomaníaca pode ter a necessidade de ter vários atos sexuais seguidos também por não conseguir satisfazer seus desejos e alcançar o orgasmo, como podemos perceber no conceito de tolerância. A personagem Joe em alguns momentos da história continua a ter diversas relações sem extrair prazer das mesmas.
Todos os fatores citados acima podem trazer como conseqüência o isolamento e a solidão, devido ao julgamento e a exclusão social que podem conduzir a sentimentos de culpa, angústia e sofrimento; como podemos perceber na fala de Joe que afirma que, apesar de estar com diversos parceiros, sentia-se constantemente sozinha, e, ao final da trama, culpa-se e afirma ser uma pessoa “ruim”. Messina (2015) discute, através de estudos norte-americanos (apud KUZMA; BLACK, 2008), que estima-se que de 3 a 6% da população possui o IES, sendo predominante casos masculinos. A autora argumenta também que a maioria das pessoas estudadas que possuem o ISE é independente financeiramente e possui um bom nível de escolaridade. Sobre os tratamentos possíveis, ela cita o uso de antidepressivos inibidores seletivos da recaptação de serotonina (podendo diminuir os sintomas de excitação e impulsividade) e a psicoterapia (que discutiremos mais a seguir).
LIBIDO
Freud (1905), em seus ensaios sobre a teoria da sexualidade, escreve que a normalidade da vida sexual se dá pela convergência de duas correntes dirigidas ao objeto e à meta sexual: “a ternura e a sensual.” (p. 127). Percebemos na estória da protagonista do longa metragem analisado, uma dissociação entre as pulsões afetuosas e as sexuais, como demonstrado logo no início da trama quando ela participa de um grupo de mulheres denominado “o pequeno rebanho”, no qual elas se comprometem a não ter relações sexuais com o mesmo homem mais de uma vez para evitar o vínculo emocional. As integrantes consideram a formação grupal como uma “manifestação contra o amor”. Mas a personagem Joe é alertada por sua amiga Vi (que não consegue permanecer fiel ao grupo após apaixonar-se), que “o ingrediente secreto do sexo é o amor”. Ao qual Joe define o amor como “luxúria acrescida de ciúmes”, o considerando um sentimento desprezível.
Em sua obra “Psicologia das Massas e Análise do Eu” (1921), Freud vai definir a libido como a energia proveniente das pulsões de tudo que pode ser abarcado sobre a palavra “amor”. Ele cita o amor de que os poetas cantam, o sexual, geralmente a união entre dois indivíduos; mas afirma que a libido é muito mais abrangente, e envolve também o amor próprio, o amor pela família, pelos amigos, pela humanidade, e também a devoção a objetos materiais ou ideias abstratas. Ele argumenta que, de acordo com a pesquisa psicanalítica, todas essas expressões são tendências dos mesmos impulsos pulsionais que buscam a união sexual, aquilo denominado por Platão como “Eros”, sendo que, nas outras formas, eles são desviados desse objetivo original, como citado pela apóstolo Paulo em sua Epístola aos Coríntios, abarcando a palavra amor em um sentido mais amplo.
Existem, pois, os impulsos considerados sexuais, e os afetuosos (inibidos em sua finalidade). Após o período de latência, que tem seu início por volta dos 6 anos e termina quando surge a puberdade, percebemos na adolescência um momento no qual os impulsos sexuais ressurgem mais fortes, ligados a fins diretamente sexuais. Segundo Freud, em casos “desfavoráveis” durante a puberdade, um jovem pode dirigir seus impulsos sexuais separados das tendências afetuosas, citando como exemplo um homem que sente-se excitado por mulheres que desconhece e pode até desprezar, mas não se relaciona com mulheres pelas quais sente respeito e admiração. “Com mais frequência, contudo, o adolescente consegue efetuar um certo grau de síntese entre o amor não sensual e celeste e o amor sensual e terreno, e sua relação com seu objeto sexual se caracteriza pela interação de instintos desinibidos e instintos inibidos em seu objetivo. A profundidade em que qualquer um está amando, quando contrastada com seu desejo puramente sensual, pode ser medida pela dimensão da parte assumida pelos instintos de afeição inibidos em seu objetivo.” (p. 27).
Num determinado momento da trama, entretanto, Joe se apaixona por seu chefe, que foi o mesmo homem com quem teve sua primeira relação sexual (que, a propósito, ela considerou uma experiência desagradável). Neste período ela não consegue sentir prazer em suas relações sexuais, proibindo inclusive os homens de tocá-la durante o ato, até parar sua atividade sexual por um período. Nesse momento, ela cita que o amor distorce as coisas, “dizemos sim, querendo dizer não”, afirma ter vergonha desse sentimento, argumentando que era algo que estava além do seu controle consciente.
Um aspecto em relação ao fato de “estar amando”, é o que Freud denomina como “fenômeno da supervalorização sexual”, onde o objeto amado tem suas características valorizadas de uma forma intensa, e desfruta de certa liberdade quanto a crítica, que prejudica o pensamento racional, conhecida na famosa expressão de que o amor nos deixa cegos; “na cegueira do amor, a falta de piedade é levada até o diapasão do crime.” (p. 28); uma tendência denominada por Freud como de idealização. O indivíduo passa a apresentar traços de humildade e limitação do narcisismo característicos de quem está apaixonado. Essa “devoção ao objeto” pode ocorrer de forma mais intensa quando o amor não é correspondido, considerando que a cada relação sexual ocorre uma diminuição dessa supervalorização. Nesse sentido, percebemos que o fato de Jeron negar ter relações sexuais com Joe a instigou ainda mais a supervalorizar o seu desejo e dirigi-lo apenas a ele (vale considerar também que foi primeiramente ela que recusou a investida dele, afirmando que “ele não era o seu tipo”, o que nos leva a reflexão de como as pessoas lidam com suas rejeições).
Freud afirma que são os impulsos sexuais inibidos em seu objetivo que proporcionam os laços permanentes entre as pessoas; visto que na satisfação sexual ocorre uma descarga de energia, já os impulsos inibidos são duradouros pois não encontram uma satisfação completa. “É o destino do amor sensual extinguir-se quando se satisfaz; para que possa durar, desde o início tem de estar mesclado com componentes puramente afetuosos — isto é, que se acham inibidos em seus objetivos” (p. 29).
Freud argumenta que, quando duas pessoas estão enamoradas elas se bastam uma a outra, procuram a solidão, um ato contra o instinto gregário, sendo que sentimentos extremos de ciúmes podem surgir para proteger esse objeto sexual escolhido. Em seu texto “O Mal-Estar na Civilização” (1930), ele escreve que: “Uma atitude psíquica desse tipo chega de modo bastante natural a todos nós; uma das formas através da qual o amor se manifesta - o amor sexual - nos proporcionou nossa mais intensa experiência de uma transbordante sensação de prazer, fornecendo-nos assim um modelo para nossa busca da felicidade.” (p. 54). Segundo ele, nós nunca nos achamos tão indefesos e desamparados contra o sofrimento como quando amamos, sendo que esse sentimento surge quando as pulsões sexuais e afetuosas se encontram dirigidas ao mesmo objeto. Podemos nos questionar até que ponto, evitar esse sofrimento, afetou as ações de Joe durante sua história; sendo que as duas únicas pessoas que ela amou na vida (além de seu genitor), acabam agredindo-a e deixando-a abandonada na rua em uma das cenas finais. É interessante citar também que, quando Joe foi casada com Jeron, ele abriu mão da exclusividade de sua relação a dois, pois percebeu que não conseguia satisfazer a esposa por completo; seu amor por ela e o medo de perdê-la, transcendia, destarte, o ciúmes de permitir que ela estivesse com outros homens.
Retomando os impulsos inibidos em sua finalidade, Freud afirma que eles foram essenciais para a formação da sociedade, da cultura e da civilização, canalizando essa força da libido para outros fins além do sexual, onde a sublimação das pulsões promove a realização de trabalhos artísticos e intelectuais, como o prazer do artista em criar e a motivação do cientista em sua busca pela verdade.
“O programa de tornar-se feliz, que o princípio do prazer nos impõe não pode ser realizado; contudo, não devemos - na verdade, não podemos - abandonar nossos esforços de aproximá-lo da consecução, de uma maneira ou de outra. Caminhos muito diferentes podem ser tomados nessa direção, e podemos conceder prioridades quer ao aspecto positivo do objetivo, obter prazer, quer ao negativo, evitar o desprazer. Nenhum desses caminhos nos leva a tudo o que desejamos. (...) Não existe uma regra de ouro que se aplique a todos: todo homem tem de descobrir por si mesmo de que modo específico ele pode ser salvo. (...) Qualquer escolha levada a um extremo condena o indivíduo a ser exposto a perigos, que surgem caso uma técnica de viver, escolhida como exclusiva, se mostre inadequada. Assim como o negociante cauteloso evita empregar todo seu capital num só negócio, assim também, talvez, a sabedoria popular nos aconselhe a não buscar a totalidade de nossa satisfação numa só aspiração.” (1930, p. 54-55).
Percebemos, como também apresentado sobre as características da ninfomania, que Joe centrava a “busca de sua felicidade” através de um único objetivo que era realizar suas fantasias e desejos sexuais, o que afetou diferentes aspectos e dimensões de sua vida, como a negligência nos cuidados ao filho, os conflitos no trabalho (em que sua chefe a obriga a participar de grupos de terapia como condição dela controlar seu comportamento e permanecer empregada), e suas próprias relações íntimas, que demonstram ser quase inexistentes. É significativo ao final da trama o fato dela dizer a Seligman, que ouviu atentamente sua história, que ela o considera “seu primeiro amigo”.
Freud também discute nessa obra, que a civilização surgiu a partir do sacrifício do ser humano em renunciar seus desejos pessoais em virtude das reivindicações culturais da sociedade, sendo que, o maior desafio que se apresenta a nós, é o de encontrar um equilíbrio conveniente entre nossos desejos e aqueles que a sociedade nos impõe. Joe, entretanto, em um determinado momento abandona a sociedade (ou é abandona por ela, como a mesma questiona) afirmando que não havia lugar para si frente a moral e aos costumes estabelecidos.
PEDOFILIA
Seligman é um personagem atento e compreensivo, que faz uma análise das experiências de Joe, citando pensadores e filósofos famosos, bem como acontecimentos históricos; defendendo Joe de si mesma e dos argumentos de que ela é uma má pessoa. No entanto, existe um momento na trama em que a expressão facial de Seligman se modifica, sua testa fica enrugada e suas sobrancelhas se movem num olhar crítico que demonstra o único preconceito que o personagem apresenta ao escutar a história de Joe, no momento em que ela conta sobre seu contato com um homem que possuía desejos sexuais por crianças.
Monteiro (2012) discute que o termo pedofilia é usado indiscriminadamente para se referir a pedófilos e a abusadores ou molestadores sexuais. A autora diferencia o quadro clínico de pedofilia e o ato criminoso, argumentando que a maioria dos pedófilos não realizam suas fantasias, e que existem abusadores que não se encaixam nos critérios que determinam o transtorno pedofílico. Segundo a CID 11, o Transtorno pedofílico é caracterizado pelo código “6D32”. O DSM-5 descreve Transtorno pedofílico segundo as seguintes características apresentadas:
“A. Por um período de pelo menos seis meses, fantasias sexualmente excitantes, impulsos sexuais ou comportamentos intensos e recorrentes envolvendo atividade sexual com criança ou crianças pré-púberes (em geral, 13 anos ou menos).
B. O indivíduo coloca em prática esses impulsos sexuais, ou os impulsos ou as fantasias sexuais causam sofrimento intenso ou dificuldades interpessoais.
C. O indivíduo tem, no mínimo, 16 anos de idade e é pelo menos cinco anos mais velho que a criança ou as crianças do Critério A.” (p. 698).
O transtorno é caracterizado quando os desejos e fantasias trazem sofrimento ao indivíduo, ou quando seus atos praticados afetam outrem (no caso um menor de idade). Nesse sentido, como já discutido anteriormente, uma parafilia não necessariamente traz um transtorno parafílico, entretanto, no caso da pedofilia, por ser uma condição na qual a satisfação diretamente sexual é considerada um crime, questiona-se como não ser um caso de transtorno frente ao sofrimento advindo da não satisfação, ou da mesma conseguida através da infração da lei.
Segundo o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), instituído pela Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990, é considerada criança aquela com até 12 anos incompletos, e adolescente aquele com 12 até 18 anos de idade. Monteiro (2012), argumenta que não existe um crime intitulado como pedofilia no Código Penal, mas apenas a descrição dos atos de abuso e violência sexual contra menores.
Conforme a Lei nº 12.015 de 7 de agosto de 2009, que trata dos “Crimes contra a dignidade sexual”, alterando o Código Penal e a lei sobre crimes hediondos, define em seu artigo 217 como Estupro de vulnerável: “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos”, considerando também o favorecimento da prostituição ou outras formas de exploração sexual de vulneráveis. Segundo seu artigo 218, define como Crime sexual contra vulnerável: “Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem”.
Segundo Castro e Bulaswski (2011, apud MONTEIRO, 2012) para ser considerado um pedófilo basta apenas a presença de desejos e fantasias com menores, sendo que eles afirmam que a maioria dos pedófilos mantem suas fantasias em segredo e não as compartilha nem as transforma em atos reais. “Os estudos desenvolvidos em torno da pedofilia têm demonstrado que esta é uma condição crônica, geralmente tem início na adolescência e persiste ao longo da vida e é mais frequente em homens do que em mulheres” (p. 05).
Segundo Casoy (2004, apud MONTEIRO, 2012), molestadores sexuais de crianças não são necessariamente pedófilos, sendo que, diferente do pedófilo, o molestador sexual nem sempre apresenta preferência sexual exclusiva por crianças, e geralmente possui comportamento social prejudicado e histórico de abusos sofridos na infância. Em geral, abusadores não são violentos e podem usar de manipulação psíquica, justificando o ato com argumentos como o de que a criança foi provocativa, procurando minimizar suas ações: “A violência física sexual contra crianças e adolescentes não é o mais comum, mas sim o uso de ameaças e/ou a conquista da confiança e do afeto da criança. As crianças e os adolescentes são, em geral, prejudicados pelas conseqüências psicológicas do abuso sexual.” (BALLONE, 2005, p. 10). Vale citar também que a maior parte dos abusos relatados tende a ocorrer por pessoas íntimas e próximas a vítima.
O pedófilo, dessarte, tem uma orientação sexual exclusivamente voltada para crianças, não havendo relação com a homossexualidade, pois os pedófilos também podem ser hetero ou bissexuais, e sentir atração por ambos os sexos. Já o molestador não tem necessariamente uma orientação sexual exclusiva a menores, podendo ser o abuso cometido de uma forma situacional, como um fato isolado. Pedofilia e abuso sexual, não são, portanto, conforme os autores citados, sinônimos.
Segundo Monteiro (2012) os atos sexuais contra as crianças podem incluir o toque, o expor-se (exibicionismo) ou despir a criança para vê-la nua (voyeurismo), valendo salientar que a pornografia infantil também é crime, conforme a Lei nº 11.829 de 25 de novembro de 2008, que altera o ECA, definindo em seu artigo 240 como crime: “Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente”, bem como seu artigo 241: “Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente”.
Na cena em que Joe conta sobre seu encontro com o pedófilo, e em como descobriu sua parafilia, ela expressa a Seligman: “Ele era uma homem que tinha conseguido reprimir o próprio desejo, jamais permitindo que se manifestasse até que eu forcei as coisas. Ele viveu uma vida inteira de negação e jamais fez mal a ninguém, eu acho isso louvável.” A qual Seligman responde: “Não! Por mais que eu tente não consigo ver nada de louvável na pedofilia.” E Joe contra-argumenta: “É porque você só pensa nos talvez 5% que talvez de fato molestam crianças, os restantes 95% nunca realizam suas fantasias, imagine como eles sofrem... A sexualidade é a força mais poderosa dos seres humanos, e nascer com uma sexualidade proibida deve ser agonizante. O pedófilo que consegue continuar vivendo com a vergonha do seu desejo sem nunca ceder a ele merece uma medalha de honra.” E ela continua sua fala expressando uma certa identificação e empatia para com ele: “Mas havia outro motivo para a minha simpatia, que você considera tão misteriosa, eu via ali um homem que estava carregando a mesma cruz que eu, a exclusão, ambos éramos proscritos sexuais.” Nesse ponto, se faz importante salientar que a dimensão da sexualidade humana não faz parte de uma escolha consciente.
Sobre o tema da castração química em casos de pedofilia, Maia e Seidl (2014) vão discutir considerações bioéticas, citando países como Canadá, País de Gales e alguns estados dos EUA, que a utilizam como penalidade; sendo que existem projetos de lei sobre o assunto em nosso país. Os autores explicam que a castração química consiste na utilização de substâncias químicas para controlar os impulsos sexuais e inibir a libido dos indivíduos. Eles discutem que a castração hormonal é reversível, mas pode trazer diversos efeitos colaterais, como problemas cardiovasculares, depressão, dores de cabeça, trombose, osteoporose, entre outros. Eles citam também a possibilidade da castração cirúrgica, esta sendo irreversível, para impedir que atos sexuais sejam concretizados. Os referidos autores mencionam a Associação Americana de Psiquiatria (American Psychiatric Association – APA) que afirma que o procedimento hormonal somente deve ser utilizado como último recurso (quando o indivíduo apresenta intensas ideias sádicas e comportamento violento contra menores), após a ausência de eficácia dos demais, enfatizando a importância do acompanhamento psicológico durante todo o tratamento do pedófilo, e citando também a prescrição de antidepressivos. Os referidos autores também questionam, sobre a discussão ética, as intervenções abusivas e experimentos cometidos contra a população mais pobre e desinformada, que não tem acesso a outras meios, como a psicoterapia.
Fica o questionamento de como uma pessoa que possui um desejo sexual exclusivamente criminoso e proibido pode satisfazer-se ou viver sua libido. Podemos retomar a discussão apresentada por Freud na Psicologia das Massas e no Mal-estar na civilização, e citar as formas de satisfação da libido desviada de seu objetivo original, como as amizades, o trabalho e as realizações artísticas e culturais. Cabe investir essa energia que nos caracteriza enquanto seres humanos em propósitos e atividades socialmente aceitas, e até consideradas pelo autor como superiores.
UMA RÁPIDA REFLEXÃO SOBRE GÊNERO
Ao final da trama ficamos com o questionamento inquietante de como Joe, uma personagem que nunca baseou os atos de sua vida por questões morais ou religiosas, e sempre pareceu desfrutar com o gozo da infração da norma, se mostra tão culpada, repetindo constantemente ser “um ser humano ruim”. Seligman questiona como ela não sendo religiosa, pode se considerar pecadora, argumentando não entender o ódio que ela demonstra por si mesma, e afirmando que seu único pecado foi “pedir mais do Sol”. Ele questiona como ela possuindo asas pode não querer voar, associando a liberdade de viver sua sexualidade.
Seligman lança um questionamento importante frente ao sentimento de culpa de Joe, referente as diferenças de gênero, questionando como seria o julgamento social frente as suas escolhas se ela fosse um homem. Um homem que, por exemplo, teve muitas mulheres ou que teve um relacionamento extraconjugal. Ele cita que Joe lutou contra o gênero que a "oprimiu e mutilou", não se limitando as restrições impostas pela sociedade.
“A palavra ‘sexo’ refere-se aqui às diferenças biológicas entre homens e mulheres. ‘Gênero’, por sua vez, refere-se às diferenças socialmente construídas em atributos e oportunidades associadas com o sexo feminino ou masculino e as interações e relações sociais entre homens e mulheres.” (IBGE, 2018, p. 02).
Esse questionamento se faz muito pertinente atualmente, considerando que, apesar das conquistas das mulheres por uma maior igualdade de gênero e justiça social, ainda se encontram sub-representadas em muitas esferas da vida pública, como é o caso do nosso país, em que apenas 16% dos senadores e 10,5% dos deputados federais são mulheres; isso considerando que mais da metade da população brasileira é composta por mulheres (IBGE, 2018). Será que estamos representados igualitariamente frente ao poder? Vale salientar também como as conquistas do movimento feminista são recentes, sendo que há menos de um século em diversos países as mulheres não podiam votar, estudar, trabalhar, ocupar cargos públicos, ter salários igualitários aos dos homens, nem sequer tinham acesso a métodos contraceptivos ou podiam controlar seu próprio corpo e sua saúde sexual e reprodutiva; sendo que, ainda hoje, existem países que permitem o casamento forçado, precoce e infantil. Segundo Welle (2017) ocorrem em torno de 7,5 milhões de casamentos ilegais infantis por ano no mundo, especialmente no Oriente Médio, sul da Ásia e em algumas regiões da África; como será que essas regiões encaram o conceito de pedofilia e abuso sexual infantil?
ASSEXUALIDADE
Um outro momento significativo da trama é quando o personagem Seligman conta a Joe que ele é assexual, confessando que nunca esteve com ninguém, o qual Joe questiona: “Você se arrepende disso?”, e ele responde que sim, mas por curiosidade e não por “luxúria”. A Rede de Visibilidade e Educação Assexuada (The Asexual Visibility and Education Network - AVEN), fundada em 2001 por pessoas consideradas assexuais e interessados pelo assunto, é considera a maior comunidade assexual do mundo, e apresenta dois objetivos principais: “criar aceitação pública e discutir a assexualidade" e "facilitar o crescimento de uma comunidade assexuada”. No site da AVEN, o assexual é definido como a “pessoa que não sente atração sexual”, conforme um dos integrantes se descreve:
“Ao contrário do celibato, que é uma escolha para se abster de atividade sexual, a assexualidade é uma parte intrínseca de quem somos, assim como outras orientações sexuais. As pessoas assexuadas têm as mesmas necessidades emocionais que todos os outros e são tão capazes de formar relacionamentos íntimos.”
Segundo explica a AVEN, os assexuais podem sentir atração romântica, estética e sensual (embora não sexual) por uma pessoa, tendo desejo de abraçar, beijar e tocar, mas não de consumar um ato sexual; sendo que costumam ser atraídos por um gênero específico. Os autores diferenciam a assexualidade de outras condições médicas como o Desejo Sexual Hipoativo (HSDD). “Nos casos de HSDD, há necessidades sexuais subjacentes que não estão sendo atendidas, a ponto de causar sofrimento pessoal.” A CID 10 traz duas classificações que não devemos, segundo a AVEN, associar propriamente a assexualidade, que são a “F52.0 Ausência ou perda do desejo sexual “ e “F52.1 Aversão sexual e ausência de prazer sexual.” Retomamos o sentido de que um transtorno ou patologia deve trazer sofrimento e prejuízos ao indivíduo ou a outros. Entretanto, a comunidade assexual afirma que essa é uma forma de viver a sua sexualidade que não lhes traz angústia ou danos. Segundo a fala de uma pessoa assexual, apresentada por Brigeiro (2013), a assexualidade: “Não se trata de evitar o sexo por medo ou como resultado de uma obrigação percebida moralmente, ou não estar interessado em formar uma família.” (p. 255).
Segundo relatos do site, pode haver excitabilidade sexual ou até casos de masturbação, mas sem que isso esteja associado ao desejo de encontrar um parceiro sexual. “Alguns irão ocasionalmente se masturbar, mas não sentem desejo de uma sexualidade a dois. Outras pessoas assexuais sentem pouca ou nenhuma excitação. Devido a que não nos importamos com o sexo, as pessoas assexuais não veem a falta de excitação sexual como um problema que deva ser corrigido e focalizam sua energia desfrutando de outros tipos de excitação e prazer.” (BRIGEIRO, 2012, p. 68).
Alfred Kinsey foi um famoso sexólogo, que ao final dos anos 40 formulou a “Escala de Kinsey” que busca avaliar a orientação sexual, trazendo uma visão mais flexível e gradual das orientações sexuais, e levando ao questionamento de que a heterossexualidade, a homossexualidade e a bissexualidade não são necessariamente categorias discretas e restritas. Na referida pesquisa, as pessoas que não se posicionavam entre os dois extremos da escolha, que ia da hetero a homossexualidade exclusiva, eram considerados “assexuais”, embora esse termo não indicasse uma orientação sexual. Segundo esses estudos, estima-se que 1% da população se classifique como assexual (apud BRIGEIRO, 2012). Segundo Brigeiro, a comunidade assexual traz a assexualidade o status de orientação sexual, conforme discute: “a definição de assexualidade se delimita a partir de uma diferenciação com o celibato, considerado uma escolha. A assexualidade, por sua vez, é explicitada como uma condição que pressupõe uma ausência de controle dos sujeitos sobre seu processo de constituição. Nesta medida, a assexualidade faz jus ao estatuto de ‘orientação sexual’, de acordo com o seu sentido mais estrito, empregado pelos especialistas. A ‘assexualidade’ seria a quarta orientação, tão válida e merecedora de aceitação como a heterossexualidade, a homossexualidade, a bissexualidade.” (p. 264-265).
Ao final do segundo volume do Ninfomaníaca, entretanto, ficamos surpresos com a cena em que Seligman, após prometer que Joe poderia descansar e não seria incomodada, entra em seu quarto aparentando estar excitado sexualmente com o início de uma ereção, e tenta estuprá-la enquanto dorme. Fica o questionamento se o autor da trama faz uma crítica a assexualidade ou se o próprio personagem não era assexual e apenas reprimiu seu desejo por nunca encontrar alguém com quem se relacionou. O próprio site da AVEN explica que existem pessoas que podem se considerar assexuais mas depois descobrirem que não o são. Um ponto importante apresentado pelo site é a abertura que eles expressam em relação a estudos e pesquisas acadêmicas, visto este ser um assunto ainda com poucas publicações e discussões científicas.
A ÉTICA DA PSICANÁLISE
Ao final da trama percebemos como Joe expressa estar mais aliviada e agradecida após contar sua história a Seligman, chamando-o de seu “primeiro amigo.” Percebemos que ela não possuía relações íntimas e permanentes, e em como, através de um ouvinte que demonstrou-se atento e compreensivo, ela pode reelaborar e repensar sua trajetória, chegando ao final a afirmar que viveria sua sexualidade de uma maneira diferente. Refletimos como a sua fala teve um efeito terapêutico e a fez ressignificar muitos acontecimentos de sua vida, isso considerando que não foi uma escuta qualificada ou profissional, como seria a de um psicólogo ou psicanalista. Mas nos abre a questão de como as escolhas de Joe poderiam ter sido diferentes em sua história se ela tivesse um vínculo estável com alguém que pudesse realmente tê-la escutado e compreendido.
Segundo a psicanalista Denise Maurano (2010), todo ser humano possui um “vazio”, que podemos traduzir por falta de alguém ou alguma coisa, e a Psicanálise, através da ética cunhada por Freud, é uma estratégia de tratar essa ausência ou incompletude que sempre nos acompanhará. Veja bem, tratamos essa ausência que se faz presente dentro de nós, mas jamais a sanamos: “o tratamento é a cura, já que não podemos nos curar da ferida de sermos humanos.” (p. 15). O efeito terapêutico é conseqüência do processo investigativo no tratamento psicanalítico.
“Viver sem se haver com a dor da falta, seja esta identificada ao que quer que seja, é simplesmente inumano. Não podemos nos livrar daquilo que constitui propriamente a nossa humanidade, a nossa diferença em relação aos outros animais. O que pode ser alterado é a maneira como vivemos a experiência da vida, a posição que ocupamos ao nos defrontarmos com a falta daquilo que supostamente iria nos tornar completos. Sugiro que a palavra ‘psicopatologia’ — em sua origem grega, ‘psico-pathos-logia’ — seja traduzida ao pé da letra: busca de sentido (logia) daquilo que causa espanto (pathos) à alma (psico). Sem dúvida que esta incompletude nos espanta, e podemos reagir a isso, neurótica, psicótica ou perversamente.” (p. 15).
Maurano argumenta que atualmente, em nossa sociedade pós-contemporânea, nos encontramos sobre “o império de Eros”, entendido não somente em seu sentido sexual, mas como “tendência à promoção de laços, tendência a estabelecer ligações”. (p. 12). “O que a psicanálise chamou de libido, energia de Eros, cobra incansáveis investimentos, sobretudo no amor e na sexualidade, e traz em seu rastro a outra face da mesma moeda: o ódio. Foi a inquietação da falta, vivida na contemporaneidade como falta de amor, ou insatisfação sexual, que deu origem à invenção da psicanálise.” (p. 12). A autora considera que, desde o surgimento da psicanálise até a atualidade, muito se modificou em nossa cultura e sociedade, porém, ela afirma que não deslocamos o nosso “apelo à libido como modo de operar com nossas inquietações” (p. 13).
“Cedo, Freud percebeu que aquilo que fazia sofrerem as mulheres que ele atendia, e lhes fazia produzir sintomas inexplicáveis aos olhos dos médicos de seu tempo, não eram senão diferentes expressões de um mal inexorável: o mal de amor. Cedo, ele se deu conta, também, de que o tratamento para isso passava pela fala (...)” (p. 12-13).
Maurano argumenta que a orientação ética que fundamenta a proposta psicanalítica, nos confronta com a vida não em sua dimensão ideal (como gostaríamos que fosse), mas em sua dimensão real, que tende a nos trazer sofrimento frente a impossibilidade de sermos completos e diante da constatação de que a satisfação ou felicidade que almejamos não está ao alcance de nossas mãos, afinal, nem tudo é como gostaríamos que fosse, e precisamos nos haver com isso; ao que ela cita “Não se pode mudar a direção do vento, mas pode-se alterar a posição das velas.”
Segundo a autora, o ser humano subverte as determinações do instinto, no sentido de que não comemos apenas por estarmos com fome, podemos, por exemplo, perder o apetite ou comer em excesso devido a um estado depressivo; em relação ao sono não dormirmos apenas por estarmos cansados, sendo que podemos ter insônia e passarmos noites acordados por um sensação de angústia ou de excitação; nossos atos sexuais também não se limitam a função reprodutora, sendo que um indivíduo pode, por exemplo, decidir-se pela abstinência sexual como forma de expressão de uma ideologia religiosa ou moral.
Segundo Maurano, nossas necessidades são intermediadas por nossas representações, conforme argumenta: “As coisas não são o que são, mas o que representam para nós.” A autora afirma que o que rege nossas ações é diferente do que conceitua-se como instinto, algo que Freud denominou como pulsão. Segundo ela inventamos a linguagem como forma de “nos comunicarmos por recursos simbólicos e imaginários. Inventamos palavras para designar as coisas, nomear o que nos falta; criamos ícones para adorar, ideologias para nos salvar do desamparo.” (p. 17). A linguagem, entretanto, traz uma certa arbitrariedade, pois as palavras são representantes de coisas e seres, mas não são os mesmos; e o sentido de palavras agrupadas numa sentença podem deixar margem a interpretações, que podem ser, por vezes, diversas e contraditórias. Uma fala interessante da personagem Joe é quando ela diz que quando uma palavra é proibida retira-se um alicerce da democracia, sendo que a sociedade apenas demonstra “sua impotência diante dos problemas concretos suprimindo palavras de seu idioma.”
Maurano destaca que a Reforma Luterana, as cruzadas pelos mares, o mercantilismo, e outros fatores, nos confrontaram com culturas, verdades e modos de viver diferentes dos nossos, nos contrastaram com a alteridade, sendo o prenúncio da modernidade. O ser humano, conforme discute a autora, possui uma tendência em polarizar sua visão de mundo, dividindo seu julgamento em opostos, como “o sagrado e o profano, o sofrimento e a alegria, a razão e a emoção, a sensualidade e a espiritualidade, o bem e o mal, a obscuridade e a luz, a vida e a morte” (p. 21). Entretanto, com a descoberta do inconsciente, nos deparamos com a possibilidade de acolhermos idéias heterogêneas e aparentemente antagônicas, sem que uma anula ou contradiga a outra.
“Nos sonhos podemos aparecer simultaneamente como crianças e velhos, como pobres e ricos, como gloriosos e decadentes, sem que uma coisa anule a outra. Também nos atos falhos — esses equívocos de linguagem que ocorrem quando queremos dizer uma coisa e dizemos outra, por vezes seu oposto — a presença do inconsciente é atestada, revelando seu modo particular de funcionamento, no qual os opostos não se anulam. Isso ocorre também em nossas fantasias, em nossos sintomas, e ainda nos chistes, esse modo peculiar de piadinhas, ditos espirituosos, através dos quais dizemos, pelo humor, o que jamais poderíamos dizer seriamente. Nossos sonhos, atos falhos, fantasias, sintomas e chistes são abordados pela psicanálise como formações do inconsciente. Como se pode facilmente perceber, essas produções não obedecem às leis da racionalidade consciente, que exige clareza, coerência, ausência de contradição. Elas revelam as leis de funcionamento do inconsciente e mostram que nosso psiquismo é muito mais amplo do que aquilo a que temos acesso pela nossa consciência. Influenciados pela consciência, temos a tendência de sempre buscar semelhanças entre as coisas, abolindo diferenças e contradições.” (p. 24-25).
Maurano argumenta que o reconhecimento do diferente como algo “errado” não apenas afeta nosso pensamento racional, como motiva inúmeros “conflitos étnicos, religiosos, políticos e de diversas outras naturezas” (p. 25). Nesse sentido, podemos refletir sobre o preconceito com o qual Joe sofreu durante sua vida, citando o momento em que ela participa de um grupo terapêutico composto por pessoas que possuíam compulsão sexual, que tinha como um dos princípios norteadores a crença de todos serem iguais. Joe até tenta se adequar e seguir as recomendações de sua terapeuta e dos integrantes, mas existe uma cena muito significativa na qual ela vê a si mesma (sua imagem criança) refletida no espelho e afirma: “Nós não somos e jamais seremos iguais”, acusando sua terapeuta de “fiscal da moral social”, controlando os comportamentos dos seus integrantes para “não deixar a burguesia se sentir enojada”, e termina sua fala afirmando: “Eu sou uma ninfomaníaca e me amo por ser desse jeito”, momento em que ela decide abandonar a sociedade e entrar para um lado ilegal das cobranças de dívidas.
Faz-se importante reconhecer que somos feitos de sofrimentos e satisfações, somos influenciados pela racionalidade e pelas emoções, por nossa aparente consciência e por tudo que jaz inconsciente nas profundezas de nossa psique. “Não se tem como afirmar algo sem se perguntar pela possibilidade de seu contrário. A psicanálise vem ressaltar que o Eu não é senão a fachada de nós mesmos, do sujeito que somos. O que realmente somos escapa às possibilidades de apreensão do Eu.” (p. 26). Maurano argumenta que na análise não tratamos uma “doença”, mas sim o sujeito que nela está implicado. Ela define como sintoma analítico qualquer sintoma que desperte no indivíduo um questionamento sobre si mesmo, uma indagação dirigida ao inconsciente: “Um questionamento dirigido pela aposta de que existe, em alguma esfera do meu psiquismo, um saber que age em mim, através de uma outra lógica que não aquela que eu reconheço conscientemente.” (p. 30).
Ao se referir a análise, a autora a apresenta como sendo um percurso que o sujeito empreende na investigação do que fundamenta sua constituição, o que implica um certo despojamento, que ela chama de “destituição subjetiva”: “Trata-se, de certa forma, de destituir o herói épico que fizemos de nós mesmos, para o melhor e para o pior, fascinados por essa imagem na qual nos fixamos, em detrimento de vivermos a dimensão mutante da vida.” (p. 27-28). Maurano também afirma que a clínica psicanalítica não ocorre numa relação em que duas pessoas interagem em um plano simétrico e igualitário, não é uma conversa entre amigos, mas uma relação em que um profissional detêm um saber que conduzirá a análise através da fala de seu cliente. Fica o questionamento das razões inconscientes e obscuras que estavam por trás das escolhas e atos de Joe, mas que não poderemos realmente saber, mas apenas supor.
Ao discutir sobre os tratamentos com medicamentos (como citamos possibilidades em casos de ninfomania e pedofilia), Maurano afirma que os psicofármacos não tratam necessariamente uma doença, mas sim seus sintomas, sendo que o seu uso abusivo (e aqui podemos questionar os interesses lucrativos dos laboratórios e empresas farmacêuticas) podem acabar isentando o sujeito da responsabilidade pelo que ele faz com seu próprio psiquismo. Ela questiona que vivemos um período em que tristeza é sinal de doença, não existe espaço para a dor, o sofrimento e sua elaboração; queremos nos ver livres logo do nosso mal estar e dessa angústia que, muitas vezes, não conseguimos nomear. “Iludidas com a ideia de que em algum lugar existem seres que não têm problemas, dificuldades, carências, timidez ou conflitos, as pessoas tendem a avaliar qualquer mal estar inerente aos impasses de se ser humano como sinais de doenças sanáveis por medicações. (...) Se alguém é tímido, o que poderia ser visto como um jeito de ser que tem inclusive seu charme, é logo induzido a pensar que sua timidez é doença.” (p. 34).
A Psicanálise, pois, se volta a fatores que fogem a possibilidade de apreensão consciente pelo sujeito; uma pessoa, por exemplo, que toma remédios para dormir, pode ter as razões que o deixam acordado intocadas em seu inconsciente. “Seu sintoma será abordado numa análise como um sinal do que você é; como um modo paradoxal de obter algum tipo de satisfação, por mais sinistra que ela seja. Chama-se a isso gozo, o processo onde prazer e dor se entrelaçam secretamente.” (p. 35).
“Nos primórdios de nossas vidas, nos constituirmos como sujeitos é uma forma de nos defendermos de não sermos nada. No que um delineamento é traçado, isso implica confrontação com limites, confrontação com uma lei, que muito antes de ter suas traduções no campo social é inerente à própria delimitação do sujeito. Tal lei é tão necessária quanto dolorosa. Freud propôs designá-la lei da castração.” (p. 39).
Segundo Maurano a lei da castração não esta necessariamente ligada ao medo da “mutilação física”, mas faz referência ao falo (desde a Grécia Antiga representado por um pênis ereto como indicativo de poder e plenitude), cujo termo representa a “ausência de limites”, a “plena potência vital”. Os homens pois, têm o pênis (um representante do falo) mas não possuem essa plena potência vital. A lei da castração, nesse sentido, está ligada ao fato do ser humano (seja ele homem ou mulher) não ter essa satisfação plena, esse “gozo supremo”, nosso prazer é sempre parcial. Essa “implenitude” ou incompletude, essa tensão que constantemente ressurge não é, no entanto, segundo a autora, negativa, mas se constitui a força que nos impulsiona em nossas escolhas e atos.
Conforme discute a autora, a lei da castração atua em nosso processo de subjetivação configurando um modo privilegiado de defesa, que Lacan (baseado em Freud) propõe delimitar em três modelos defensivos: neurose, psicose e perversão. De forma resumida, um neurótico é aquele que sofre com a “lei”; um psicótico a infringe, mas sem perceber conscientemente os limites ultrapassados, por isso, segundo a autora, o Direito pode considerar um psicótico como “inimputável”, não podendo “responder juridicamente por seus atos transgressivos.” (p. 40); já o perverso não desconhece a lei, assim como o neurótico ele tem consciência dos limites, mas goza com a sua transgressão. Segundo a autora, a suposição diagnóstica de como o sujeito se coloca frente a lei da castração, é essencial para avaliar as possibilidades de intervenção. Percebemos que a estrutura psíquica da personagem Joe é perversa, visto que ela infringe a lei e as normas estabelecidas culturalmente e obtêm prazer disso.
Em relação a um sintoma, Maurano explica que por mais prejuízos que traga, é a forma que o sujeito encontrou para lidar com um conflito encoberto. O importante, segundo a ética da Psicanálise, é que não devemos tratar um sintoma como “defeito ou degeneração, mas como uma via de expressão do sujeito” (p. 45). “Freud percebeu que o sintoma constitui-se como uma defesa frente a algo intolerável psiquicamente. Em termos sumários, um conflito entre o desejo que move o sujeito e aquilo que o censura. O sintoma é, portanto, em si mesmo o efeito de um paradoxo. É um compromisso com o desejo que nos anima, é expressão desse desejo e, ao mesmo tempo, é a marca de seu recalcamento.” (p. 45-46).
A autora argumenta que, segundo a Psicanálise, todos nós nascemos numa condição de desamparo, na qual o bebê chora, grita e esperneia sem nada poder fazer para mudar sua situação de fome, desconforto ou dor; essa situação só se resolve quando alguém intervém, através do qual se produz uma marca psíquica, uma primeira experiência de satisfação. Nosso desejo, pois, se configura através do remetimento a uma falta, a esse Outro que nos salvou do desamparo (que ao mesmo tempo que nos salva nos assujeita a ele). O desejo desse Outro, nesse sentido, afeta a constituição de nossa subjetividade. “Desse modo, nossa subjetivação se dá por uma dupla operação: por um lado, nos alienamos no desejo desse Outro, como via de salvação, porém por outro lado é preciso que nos separemos dele, para podermos constituir o nosso próprio desejo, ainda que seja para desejarmos o desejo desse Outro.” (p. 50). Nossa vida é, pois, marcada pela tentativa de responder ao desejo desse Outro. Não podemos, entretanto, supor de que forma os desejos de seus genitores afetaram o desejo da personagem Joe. No início da trama ela se refere a mãe como “vadia insensível”, e expressa como se irritava com o fato da genitora jogar paciência com o baralho, situação que percebemos ela mesma repetindo mais ao final da estória quando passa a morar junto de “P” , uma jovem que acolhe (filha de um pai preso e de uma mãe falecida por overdose) para que possa ser sua mentora e para que a jovem a substitua em seu trabalho de cobrança de dívidas. Percebemos que Joe se afeiçoa a P, chegando inclusive a dividir com ela as histórias sobre árvores que eram exclusivas da relação com seu genitor.
“A clínica psicanalítica não é senão a clínica do desejo e seus impasses. Deparamo-nos todo o tempo com as inúmeras estratégias do desejo que insiste em apelar à satisfação, sem nunca obtê-la plenamente.” (p. 48). Segundo Maurano, Lacan propõe que a análise visa o atravessamento da fantasia de que conseguiremos responder ao desejo do Outro e gozar plenamente, nos tornando um sujeito sem faltas. Esse atravessamento, segundo a autora, implica um certo luto do sujeito com seu objeto (ou seu valor absoluto), e implica também “um reposicionamento do sujeito na relação com o Outro”.
“(...) o Outro, a exterioridade é o que vige no mais íntimo de nós mesmos, é o ponto de fundação de nosso próprio desejo. Esta é a razão pela qual o Inconsciente, enquanto homogêneo ao desejo, enquanto expressão mesma do desejo, é social, referenda-se no que nos vem de fora.” (p. 51).
Nesse sentido, a autora cita o exemplo dado por Lacan da fita de Moebius, na qual nossa interioridade e nossa exterioridade interconectam-se sem excluir-se. “Pode-se dizer que nossa interioridade é uma dobra da exterioridade (...)” (p. 52).
Retomando o conceito de análise, Maurano argumenta que um pedido de ajuda não é, simultânea ou consequentemente um pedido de análise, da mesma forma que um pedido de análise pode não implicar um desejo de análise. Ela afirma que a Psicanálise não é uma questão de necessidade, mas de desejo. Segundo ela “não é a natureza do sofrimento que delimita o campo de intervenção do analista, mas o modo de relação do sujeito com seu sofrimento, seja ele qual for.” (p. 31). Segundo a autora, através da transferência, do modo particular com que o analisando dirige-se ao analista, expressa-se a forma como ele vivencia suas relações pessoais e laços significativos, demonstrando a posição que esse sujeito ocupa frente ao Outro. Antes dessa transferência, desse investimento e vínculo sejam estabelecidos, não existe análise possível; não podemos analisar um indivíduo, segundo ela, só pela observação de seu comportamento, sem estabelecermos essa relação com ele.
Maurano apresenta que a função do analista é situar o sujeito em sua própria fala, permitir que ele escute a si mesmo, que intrigue-se com aquilo que expressa, para que possa implicar-se com seu próprio posicionamento. Perceber o que o determina, para que possa posicionar-se quanto a isso, e também determinar-se. Como poderia, dessa forma, a Psicanálise ser determinista e passiva quando permite ao sujeito a possibilidade de conhecer a si mesmo, “curar-se” através de sua fala e, a partir disso, modificar-se?
Voltando ao sentimento de culpa de Joe, é interessante pensar que ao final da trama ela se culpa em grande parte por algo que queria fazer mas não fez, castigando-se psiquicamente por sua intenção, que era de matar Jeron. Ela aponta um revólver para ele, mas o gatilho ao ser pressionado não dispara a bala. Ela se considera uma pessoa ruim pelo desejo que teve de matar outro ser humano, mas Seligman a relembra que ela não o fez, ao que ela retruca que foi devido a um motivo fortuito. Seligman lança então o questionamento de que esse ato tenha se dado devido a uma resistência subconsciente, argumentando que na superfície ela queria matá-lo mas em suas profundezas não, visto que ela sabia como engatilhar uma arma.
Ao sentir-se compreendida, e de certo modo, despida de toda sua culpa e vergonha, Joe agradece a Seligman por tê-la escutado sem julgá-la, e expressa como contar sua história a fez sentir-se aliviada e repensar sua vida. Ao final ela diz que tomou a decisão de não viver mais sua sexualidade, ao qual Seligman questiona “Mas será uma vida que vale a pena viver?” e ela responde “É a única forma de eu poder viver”, dizendo que vai enfrentar todas as suas adversidades como uma árvore deformada numa montanha (lembramos da relação com seu pai, e em como ele lhe dizia que no inverno podiam ver as almas das árvores).
Uma frase muito significativa de Joe é quando ela expressa: “Mas acima de tudo eu quero agradecer ao meu novo e talvez primeiro amigo, obrigada Seligman.” “Você parece feliz” – comenta ele, e ela responde: “Eu também me sinto feliz por aquele tiro não ter saído e eu não ter me tornado uma assassina.” Seligman sai do quarto para permitir que Joe descanse e promete que ela não será incomodada. Entretanto, na cena final, infelizmente, Joe é julgada e desrespeitada e dessa vez não esquece como desengatilhar o revólver. Ficamos com o questionamento de como Joe seguiu sua vida... Renunciou a sua sexualidade? Conseguiu vivenciá-la de uma forma mais equilibrada? Continuou a margem da sociedade? Que consequências o fato de realmente ter se tornado uma “assassina” lhe trouxeram?
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percebemos através da análise do longa-metragem Ninfomaníaca e das discussões entre os vários autores citados, como a contribuição da Psicanálise possui um valor imensurável no tocante a tentativa de compreensão acerca da complexidade da sexualidade humana. O próprio Freud (1914), em seus primeiros escritos, reconheceu que enfrentaria críticas e resistências com a sua teoria do inconsciente e que possivelmente só seria compreendido após sua morte, chegando a considerar que passaria a fazer parte do grupo daqueles que “perturbaram o sono do mundo.”
Lopes (2018) discute que o valor estabelecido como “anormal” no tocante a sexualidade, pode variar conforme cada época histórica e contexto sociocultural. Como podemos considerar ao citar que, antes de 1990, a homossexualidade fazia parte da lista internacional de doenças mentais, sendo ainda proibida e considerada crime em 71 países do mundo, sendo que 7 deles preveem a pena de morte (MANTOVANI, 2018). Vale citar que a Suprema Corte da Índia descriminalizou no ano passado a homossexualidade no país. Muitas conquistas ainda são recentes, e muitas batalhas ainda precisão ser travadas e diálogos realizados para garantir o direto das pessoas viverem sua sexualidade de uma maneira saudável e livre de violência e coerção.
Segundo Lopes (2018) muitas pessoas acabam negando o seu desejo pulsional para serem aceitas devido as restrições sociais e aos tabus culturais com forte influência religiosa, sendo que, quando a pessoa sucumbe aos seus desejos “perversos”, pode desenvolver sentimentos de frustração e culpa. “O valor moral estabelecido socialmente faz com que parceiros sexuais se sintam constrangidos, com medo, vergonha ou receio da reação do outro ao se abrir sexualmente, expondo seus desejos, fantasias e anseios sexuais, o que poderá se apresentar posteriormente como fonte de frustrações, angústias, e sofrimento psíquico.” (LOPES, 2018, p. 02).
Existem parafilias que trazem um sofrimento significativo na vida dos sujeitos, podendo acarretar prejuízos a outrem, mas vale relembrar que nem todas as parafilias são transtornos parafílicos ou requerem tratamento clínico. Vale salientar também que o sofrimento advindo de um “desvio sexual” pode decorrer não do desejo em si, mas da exclusão do sujeito “por não se adequar sexualmente ao contexto que esta inserido (...)” (LOPES, 2018, p. 14). “A orientação profissional, quando acontece, precisa convencer a pessoa a tomar consciência de que deve viver sua sexualidade parafílica com a mesma responsabilidade civil da sexualidade convencional e que, apesar dela não ser responsável por suas tendências, ela o é em relação à forma como as vive. A Parafilia deve ajustar-se às normas de convivência social e respeito ao próximo” (BALLONE, 2005, p. 03).
Em relação a origem de uma parafilia, também é importante enfatizar que: “O determinante da constituição de uma parafilia é multicausal, não será um evento único e isolado que poderá determinar os percursos do desejo parafílico no sujeito. Embora sempre sendo defendido os aspectos causadores como exposições e experimentações no decorrer da infância e adolescência no percurso do despertar da sexualidade em sua forma mais primitiva e polimorfa. Fatores como a história individual, subjetiva e peculiar do sujeito, suas vivências e experimentações, suas frustrações, seu desenvolvimento emocional, psíquico e sociocultural, suas relações ao meio, suas tendências, eventos traumáticos ou não, dentre outros fatores colaboram para que o sujeito venha a desenvolver um desvio sexual ao longo do percurso de vida.” (LOPES, 2018, p. 04).
Em relação aos preconceitos impostos socialmente, Freud discute:
“Quanto ao indivíduo sexualmente maduro, a escolha de um objeto restringe-se ao sexo oposto, estando as satisfações extragenitais, em sua maioria, proibidas como perversão. A exigência, demonstrada nessas proibições, de que haja um tipo único de vida sexual para todos, não leva em consideração as dessemelhanças, inatas ou adquiridas, na constituição sexual dos seres humanos; cerceia, em bom número deles, o gozo sexual, tornando-se assim fonte de grave injustiça. (...) A civilização atual deixa claro que só permite os relacionamentos sexuais na base de um vínculo único e indissolúvel entre um só homem e uma só mulher, e que não é de seu agrado a sexualidade como fonte de prazer por si própria, só se achando preparada para tolerá-la porque, até o presente, para ela não existe substituto como meio de propagação da raça humana.” (1930, p. 29).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (2016), o conceito de saúde sexual é atualmente entendido em um sentido mais amplo, como um “um estado de bem-estar físico, emocional, mental e social em relação à sexualidade.” Envolvendo, além dos aspectos da saúde reprodutiva, o direito a uma vida sexual segura e livre de violência e discriminações.
Maurano (2010) discute a importância de que a Psicanálise, além do trabalho clínico, seja um referencial ético e teórico para intervenções em diversas áreas do campo social, atuando em instituições e dialogando com diferentes saberes, contribuindo para a transformação social. Nesse ponto, afirmamos nosso comprometimento ético e social contra as discriminações e qualquer forma de violência, bem como a superação de preconceitos sobre questões relacionadas a sexualidade humana.
A autora argumenta que a Psicanálise está situada num âmbito entre a ciência e a arte, sendo que “o cientista tem sempre muito a aprender com aquilo que o artista antecipa” (p. 08). Por fim, encerramos essa análise com a seguinte citação: “Transmitir aquilo a que a psicanálise diz respeito não é uma tarefa nada fácil, sobretudo porque a objetividade tão cara ao discurso científico é impotente para abordar a complexidade do psiquismo humano. Não é à toa que Freud, o inventor da psicanálise, valeu-se inúmeras vezes da arte, da literatura, da mitologia, da filosofia, entre muitos outros recursos, para explicitar seus pressupostos. É como se encontrasse neles vias para mostrar a dimensão do indizível, do que escapa à possibilidade de ser abordado pelo universo da lógica da consciência.” (MAURANO, 2016, p. 08).
Emerson Gonçalves Dutra Filho
Tiago de Sousa Medeiros
REFERÊNCIAS:
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